A
discussão sobre a constitucionalidade ou não da reserva de vagas em
universidades públicas a partir de critérios raciais e sociais, as
chamadas cotas, é pauta de julgamentos do Supremo Tribunal Federal
(STF) desta quarta-feira (25).
Serão
julgadas a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental
(ADPF) 186 e o Recurso Extraordinário (RE) 597285, ambos de
relatoria do ministro Ricardo Lewandowski, e a Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 3330, que contesta o Programa
Universidade para Todos (ProUni), relatada pelo atual presidente do
STF, ministro Ayres Britto. Será o primeiro julgamento plenário da
gestão do ministro Ayres Britto, que tomou posse na Presidência do
STF na última quinta-feira (19).
O
tema é polêmico e foi debatido em audiência pública realizada em
março de 2010, com a participação de 38 especialistas de entidades
governamentais e não governamentais. O ministro Lewandowski acolheu
pedidos de participação no julgamento na condição de amigos da
Corte (amici curiae) feitos pela Defensoria Pública da União,
Fundação Nacional do Índio (Funai), Instituto de Advocacia Racial
e Ambiental (Iara), Movimento Pardo-Mestiço Brasileiro (MPMB),
Fundação Cultural Palmares, Movimento Negro Unificado (MNU) e
Educação e Cidadania de Afrodescentes e Carentes (Educafro). O
relator rejeitou, entretanto, pedidos idênticos feitos pela Central
Única dos Trabalhadores do Distrito Federal (CUT/DF) e do Diretório
Central dos Estudantes da UnB (DCE-UnB).
ADPF
186
A
ação foi ajuizada em julho de 2009 pelo Partido Democratas (DEM)
contra atos administrativos do Conselho de Ensino, Pesquisa e
Extensão da Universidade de Brasília (Cepe/UnB). A UnB adotou
critérios raciais para o ingresso de alunos na universidade pelo
sistema de reserva de vagas. Os atos administrativos e normativos
questionados determinaram a reserva de 20% do total das vagas
oferecidas pela universidade a candidatos negros (incluindo pardos).
Na
ação, o DEM alega que a política de cotas adotada na UnB fere
vários preceitos fundamentais da Constituição Federal, como os
princípios republicano (artigo 1º, caput) e da dignidade da pessoa
humana (inciso III); repúdio ao racismo (artigo 4º, inciso VIII);
igualdade (artigo 5º, incisos I) e legalidade (inciso II).
Considera
ainda a ação que há ofensa aos princípios da impessoalidade, da
razoabilidade, da publicidade e da moralidade, além de dispositivos
que estabelecem o direito universal à educação (artigo 205); à
igualdade nas condições de acesso ao ensino (artigo 206, caput e
inciso I); à autonomia universitária (artigo 207, caput) e ao
princípio meritocrático – acesso ao ensino segundo a capacidade
de cada um (artigo 208, inciso V).
Pioneira
A
UnB foi a primeira universidade federal a instituir o sistema de
cotas, em junho de 2004, após cinco anos de debates. A ação
afirmativa fez parte do Plano de Metas para Integração Social,
Étnica e Racial da UnB e foi aprovada pelo Conselho de Ensino,
Pesquisa e Extensão. No primeiro vestibular, o sistema de cotas foi
responsável por 18,6% dos candidatos. A eles, foram destinados 20%
do total de vagas de cada curso oferecido.
A
comissão que implementou as cotas para negros também foi
responsável pelo convênio entre a UnB e a Fundação Nacional do
Índio (Funai), assinado em 12 de março de 2004. Conforme o acordo,
a cada semestre, dez indígenas aprovados em um teste de seleção
ingressam na universidade. A oferta de cursos para esses alunos varia
de acordo com as necessidades da tribo e a disponibilidade de vagas
na instituição. A Funai oferece suporte de moradia aos indígenas
e, em contrapartida, a UnB oferece apoio acadêmico para que eles
permaneçam na instituição.
RE
597285
Este
Recurso Extraordinário foi interposto pelo estudante Giovane
Pasqualito Fialho, que não foi aprovado no vestibular da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para o curso de
Administração, embora tivesse alcançado pontuação superior à de
outros candidatos. Os concorrentes que tiveram nota menor foram
admitidos pelo sistema de reserva de vagas para alunos egressos das
escolas públicas.
Segundo
o estudante, das 160 vagas para o curso, 30% foram destinadas a
candidatos privilegiados em razão de sua etnia e condição social e
10 vagas a candidatos indígenas. Segundo o recurso, o sistema de
cotas seria um “pacto da mediocridade”, além de ser crime de
racismo a distinção no tratamento dos candidatos com base em
critério étnico.
O
estudante pediu a antecipação de tutela para a efetivação de sua
matrícula na UFRGS, mas o pedido foi negado pelo ministro
Lewandowski, até que a controvérsia jurídica seja resolvida.
“Enquanto essa Corte não se pronunciar pela inconstitucionalidade
desse sistema de admissão, presume-se a sua constitucionalidade”,
disse o ministro, ao negar a antecipação de tutela, em maio de
2010.
Em
setembro de 2009, o Plenário Virtual do STF reconheceu a existência
de repercussão geral para a matéria. A Procuradoria Geral da
República emitiu parecer pela constitucionalidade do sistema de
reserva de vagas adotado pela UFRGS e, portanto, pelo não provimento
do recurso.
Na
UFRGS, o sistema de cotas passou a vigorar em 2008. Desde então, 30%
das vagas são reservadas, sendo metade para alunos que tenham
cursado todo ensino médio e pelo menos quatro anos do ensino
fundamental em escolas públicas e metade para alunos autodeclarados
negros, desde que também tenham vindo de instituições de ensino
públicas. Os egressos de escolas públicas, no ato da matrícula,
entregam à Comissão de Graduação da Universidade os certificados
de conclusão de curso e históricos escolares. Os candidatos que se
declaram negros, se aprovados, assinam uma autodeclaração
étnico-racial junto à comissão.
ADI
3330
A
discussão em torno de políticas afirmativas para a reserva de vagas
por critérios sociais e raciais também chegou às universidades
particulares com a criação do Programa Universidade para Todos
(ProUni). O programa foi instituído pela Medida Provisória 213/04,
convertida na Lei 11.906/05, e está sendo questionado no Supremo por
meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 3330.
A
lei determina que, para receberem os benefícios do ProUni, as
universidades privadas devem reservar parte das bolsas de estudo para
alunos que tenham cursado o ensino médio completo em escola da rede
pública ou em instituições privadas na condição de bolsista
integral, sendo que parte das bolsas deve ser concedida a negros,
indígenas e pessoas portadoras de necessidades especiais.
No
STF chegaram três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI)
questionando o Prouni. A principal delas, a ADI 3330, foi ajuizada
pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino
(Confenem), o Democratas (DEM) e a Federação Nacional dos Auditores
Fiscais da Previdência Social (Fenafisp). Também chegaram ao STF
outras duas ações, a ADI 3314 e a ADI 3379, ambas apensadas à ADI
3330. Em preliminar, os ministros consideraram que a Fenafisp não
tem legitimidade ativa para propor a ação.
Segundo
a Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, a medida
provisória que originou o ProUni não atende aos requisitos de
“relevância e urgência” para sua edição, previstos no artigo
62, parágrafos 1º e 2º, da Constituição Federal, e ofende o
princípio constitucional da isonomia entre os cidadãos brasileiros,
além de desvirtuar o conceito constitucional de entidade beneficente
de assistência social.
Em
abril de 2008, o relator da matéria levou a ação a julgamento em
Plenário. Em seu voto, o ministro Ayres Britto rechaçou um a um os
argumentos contra o programa. Ele julgou a ADI 3330 improcedente e
considerou o ProUni constitucional. Na avaliação de Ayres Britto, o
programa é uma forma eficaz de combate a situações de desigualdade
e reequilíbrio social. O julgamento foi então interrompido por um
pedido de vista do ministro Joaquim Barbosa. A análise da ADI 3330
será retomada com esse voto-vista.
O
programa
O
ProUni tem como finalidade a concessão de bolsas de estudo integrais
e parciais em cursos de graduação e sequenciais de formação
específica, em instituições privadas de educação superior.
Criado pelo Governo Federal em 2004, oferece, em contrapartida,
isenção de alguns tributos àquelas instituições de ensino que
aderem ao programa.
É
dirigido aos estudantes egressos do ensino médio da rede pública ou
da rede particular na condição de bolsistas integrais, com renda
per capita familiar máxima de três salários mínimos. Os
candidatos são selecionados pelas notas obtidas no Enem (Exame
Nacional do Ensino Médio). Desde sua criação, o ProUni já atendeu
919 mil estudantes, sendo 67% com bolsas integrais.
(STF)
FONTE : DOL
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